a porta, enfim, se abriu. depois de meses delirantes, teatros e silêncios, finalmente uma frestinha se abriu. pequena, quase tímida, mal deixando o ar circular. no breu, um olho suspenso investigava o ambiente antes de arriscar revelar um pouco mais do corpo. a mão permaneceu firme no trinco, segurando não só a madeira, mas a própria vida. pronta para fechar de novo ao menor sinal de perigo, ao mais breve gesto que lembrasse um pretérito mais que imperfeito.
eu esperava do lado de fora, sem pressa, deixando apenas o tempo respirar por mim. não trouxe promessas fáceis nem palavras ensaiadas. mas o desejo de construir algo novo, com a calma e a inteireza que antes não sabiam de mim.
sei que a porta pode se fechar a qualquer momento, que o trinco pode estalar de novo e me devolver ao lado de fora. mas se acontecer, não partirei vazio. levo comigo o compromisso de fazer tudo o que não fiz antes, ainda que sem garantia de retorno.
eu lia nas entrelinhas, nas linhas, no rodapé e nas notas escritas à mão no canto de cada página, lia medo e resistência, mas também uma vontade escondida de acreditar. porque apesar dos traumas, apesar do abismo cavado entre nós, há ainda uma verdade que pulsa; e nela se desenha um processo de cura.
a porta não se abriu inteira. apenas o suficiente para deixar passar o ar doce da primavera.
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