terça-feira, 7 de outubro de 2025

o não-voo

faz mais de um mês que carrego uma dor no trapézio direito
dizem que é estresse e ansiedade
mas parece que cortaram na carne

onde antes era asa, agora há um ponto de tensão
um nó cego
a lembrança do voo ainda latejante

já fiz de tudo pra parar de sentir
alongamento, yoga, compressa quente, compressa fria
massagem, ventosa
nada consegue desamarrar

num esforço desesperado acendi uma vela de sete dias
e deixei um bilhetinho embaixo
um pedido, uma oração, um suspiro

no início queimou tímida mas constante
nos últimos dias estava deformada
desfigurada, obedecendo outro sentido
não se via mais vela nem farol

a chama inclinava-se sobre o bilhete
roendo-o com paciência escassa
quando a cera derreteu por completo
o papel incendiou, a vela virou fogueira doce
e o ar cheirava a promessa queimada

precisei apagar por segurança
agora resta a cera derretida sobre cinzas
chão queimado e o eco do que foi dito

as palavras, antes pedidas
viraram fumaça preta no ar
e talvez tenham sido ouvidas



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