Tem cartas que não foram feitas para chegar. São escritas como se fossem bilhetes esquecidos ao vento, rabiscos deixados na mesa da alma para que o tempo leve — ou ao menos alivie.
Hoje escrevo uma dessas.
Escrevo mesmo sabendo que não vai ler. Mesmo sabendo que talvez não queira, talvez não devesse. Mas escrevo. Porque precisei encontrar uma forma de me despedir. A palavra, mesmo muda, ainda é a minha maneira de tocar sem invadir.
Escrevo da saudade do que parecia pequeno: a respiração funda quando o mundo pesava, o murmúrio quase inaudível, a cabeça que caía nos ombros quando a tristeza pousava sem pedir licença. Coisas que ninguém mais notava, mas que pra mim diziam tudo.
O olhar dela profundo que me atravessou desde o primeiro dia. Esse olhar, que um dia me enxergou, agora me foge. E talvez seja justo. Talvez seja assim que os finais acontecem: sem escândalo, só silêncio.
O que vivemos. Disfarçado, adiado, remendado. Foi o mais intenso. Curioso como só se tornou claro no fim, quando a palavra já era sombra.
Sinto muito por precisar escrever isso. Por não ter conseguido dizer antes. Por ainda estar aqui, sem estar mais.
Eu sigo com a saudade — do cheiro, do som, do toque, da palavra, do silêncio, da presença e da ausência.
Isso é o que restou: uma crônica para ninguém. Ou, talvez, uma forma de existir um pouco além da dor.
E então, com delicadeza, encerro.
Sem resposta, sem retorno.
Só um suspiro.
E um adeus.
Nenhum comentário:
Postar um comentário