segunda-feira, 15 de setembro de 2025

qué, fí

fermento por dentro.
microvidas conspiram em revoluções silenciosas,
nas minhas entranhas dançam assembleias invisíveis.
sou campo de cultivo,
mangue de transformação bioquímica,
um ecossistema em revolta doce e lenta.
comitê revolucionário visceral.

a digestão não é só quebra de moléculas,
é decomposição cultural.
cada célula epitelial do intestino
carrega mais decisão que qualquer algoritmo de vigilância.
sou permeável.
engulo o mundo, deixo ele me atravessar,
tecnologias entéricas que selecionam o que fica,
o que vira energia,
o que se dissolve em nada.

o intestino é meu segundo cérebro,
mais antigo, mais esperto.
ele não julga, só sente.
enquanto o cérebro pensa em palavras,
o intestino pensa em ácidos,
materna bactérias,
cultiva futuros possíveis,
engole o tempo e devolve vivo.

decompor estruturas rígidas,
dissolver categorias,
transformar o cru em algo digerível.
ser saudável, hoje,
é suportar ser invadido,
permitir que nos mastiguem,
nos processem,
nos integrem.
sou, sobretudo, poroso.

e se há um futuro,
ele começa no estômago,
onde o tempo não é cronológico,
mas químico,
um calendário de enzimas
marcando a história na língua.

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